Por: Melquisedeque J. Santos MTB: 0098469/SP | Vale Jornalismo Online
O Vale do Ribeira volta a ser palco de uma ação que une cultura, memória e sustentabilidade. O projeto “Rotas de Memória e Turismo de Base Comunitária”, promovido pelo Sesc São Paulo, chega à região com o propósito de fortalecer o protagonismo das comunidades tradicionais e valorizar suas identidades culturais, saberes e modos de vida.
Inspirada na iniciativa nacional “Sesc Raízes – Territórios de Memória e Patrimônio Cultural”, a ação aposta em um modelo de turismo que nasce de dentro para fora — feito com e pelas comunidades, respeitando seus ritmos, memórias e modos de existir.
Um território que fala de si
Nos meses de outubro e novembro, o projeto toma forma no Vale do Ribeira por meio de uma agenda intensa de cursos, oficinas, rodas de conversa, visitas guiadas e mapeamentos culturais. O foco é claro: promover o turismo sustentável e comunitário, preservando o patrimônio cultural e ambiental da região.
As atividades envolvem indígenas, quilombolas, caiçaras, ribeirinhos, caboclos, mestres e mestras da cultura, artesãos e monitores ambientais, além de pessoas engajadas com a história e o turismo local. É um movimento que reconhece a força das raízes afro-ameríndias e a importância da coletividade na preservação da memória.
Turismo com e a partir das comunidades
Com uma das maiores áreas contínuas de Mata Atlântica do país e lar de povos que mantêm vivas tradições centenárias, o Vale do Ribeira é um mosaico de biodiversidade e cultura. Aqui, turismo e ancestralidade caminham lado a lado.
Comunidades como os Quilombos Ivaporunduva (Eldorado) e Mandira (Cananéia), além de caiçaras da Ilha do Cardoso, são exemplos vivos de que o Turismo de Base Comunitária (TBC) pode ser uma ferramenta real de desenvolvimento — sem romper com o equilíbrio entre cultura, território e meio ambiente.
Mais do que um roteiro turístico, o projeto é um convite a escutar as vozes da terra e do povo, resgatando práticas tradicionais, histórias e modos de fazer que resistem ao tempo.
Formação e prática: entre Iguape e os quilombos
Entre as ações, destaca-se o curso “Territorialidades e Valores Afro-ameríndios: Desenvolvimento e Planejamento do Turismo de Base Comunitária”, ministrado na Fábrica de Cultura 4.0 de Iguape e no Quilombo Ivaporunduva, em Eldorado.
As aulas, conduzidas por Cláudia Santos (turismóloga, doutoranda em Planejamento Territorial) e Alessandra Ribeiro (historiadora e doutora em Urbanismo), abordam desde gestão de experiências turísticas e hospitalidade até produção, logística e comunicação comunitária. Tudo guiado por princípios como ancestralidade, oralidade, espiritualidade e integração com a natureza.
“Essas formações são oportunidades de os próprios moradores repensarem o turismo como um espaço de afirmação cultural e autonomia”, explica Cláudia Santos.
Mapeamento das memórias e saberes
Outra frente do projeto é o mapeamento participativo de experiências em turismo e práticas culturais, envolvendo comunidades de Cananéia, Ilha Comprida, Iguape, Apiaí, Iporanga e Eldorado. A pesquisa será coordenada pelo turismólogo Júnior dos Santos e pela educadora caiçara Alyson da Costa, que há mais de três décadas atua com ecoturismo e cultura tradicional no Vale.
A ideia é registrar, sistematizar e divulgar os saberes locais, criando um diagnóstico que mostre as potências e desafios do território, ajudando as comunidades a planejar seus próprios caminhos dentro do turismo sustentável.
Bioconstrução e cartografia viva
No Quilombo São Pedro (Eldorado), acontecem as oficinas de Cartografia de Memória e Bioconstrução, onde moradores e especialistas constroem juntos não apenas maquetes e projetos arquitetônicos — mas também novos espaços de pertencimento.
Com técnicas tradicionais como taipa de mão, adobe e pau-a-pique, a arquiteta Akemi Hijioka (IFSP-Registro) e mestres locais desenvolvem um projeto coletivo de “casa da memória” para o quilombo, símbolo da relação entre território, ancestralidade e sustentabilidade.
Um futuro que nasce da memória
Para Ana Carolina Vieira e Ana Caroline Araújo, da Gerência de Cultura do Sesc, o “Sesc Raízes” é mais do que um projeto cultural:
“É um compromisso com a preservação do patrimônio e com o fortalecimento das redes comunitárias, reconhecendo que a economia da cultura é também uma economia da vida”, afirmam.
O Sesc São Paulo reforça que o Turismo de Base Comunitária é um caminho para a autogestão, a valorização das identidades e a proteção dos territórios. Em tempos em que o turismo massivo ameaça descaracterizar culturas, o Vale do Ribeira mostra que é possível fazer diferente — com respeito, escuta e propósito.
Programação
• Curso: “Territorialidades e Valores Afro-ameríndios”
o Fábrica de Cultura (Iguape): 04-05/10 e 11-12/10
o Quilombo Ivaporunduva (Eldorado): 18-19/10 e 01-02/11
• Diagnóstico Participativo:
o Cananéia, Ilha Comprida e Iguape: 06 a 15/10
o Apiaí, Iporanga e Eldorado: 17 a 24/11
• Oficinas de Bioconstrução e Cartografia de Memória:
o Quilombo São Pedro (Eldorado): 08-09/11; 15-16/11; 29-30/11
Atividades gratuitas. Mais informações em: sescsp.org.br/registro