
Iguape completa 486 anos e, enquanto celebramos sua longa trajetória, somos chamados a refletir sobre o que significa viver em um lugar que carrega o peso de quase cinco séculos de história. Uma cidade que já foi palco de conquistas e conflitos, de glórias e quedas, mas que, acima de tudo, aprendeu a sobreviver e a renascer de cada capítulo que o tempo escreveu em suas margens. Cada pedra de suas ruas e cada curva de seus rios contam uma história que vai além dos livros: é uma história pulsante, que reverbera em seus habitantes, em suas tradições e em seu espírito resiliente.
Iguape, cujo nome significa "na enseada do rio" em tupi, é como uma concha onde as marés depositaram ao longo dos anos fragmentos de vidas, culturas e sonhos. Seus sambaquis, testemunhas pré-históricas, são um eco das primeiras mãos que moldaram o terreno, acumulando conchas como testemunhas da eternidade. O passado de Iguape não se limita às memórias congeladas em suas construções coloniais, mas vive nas águas que correm, nas montanhas que guardam segredos de ouro e nas histórias de fé que movem seus habitantes.

Entre as páginas mais emblemáticas desse livro de quase cinco séculos está a busca pelo ouro, que fez brilhar a cidade e atraiu olhares gananciosos e corajosos. É fácil imaginar as luzes da Casa de Fundição de Ouro refletindo nos olhares ávidos dos colonizadores, enquanto o ouro se desfazia em impostos e promessas de riquezas eternas. Essa era passou, e, como em todo ciclo de prosperidade, também veio a decadência, mas não sem deixar suas marcas indeléveis. O Valo Grande, canal que um dia simbolizou a esperança de riqueza, tornou-se testemunha de que a natureza sempre reclama seu lugar, assoreando e transformando o que o homem tenta subjulgar.

No entanto, o que torna Iguape especial é sua capacidade de renascer. Quando a busca pelo ouro se foi, outras riquezas tomaram seu lugar: a fé, simbolizada na devoção ao Senhor Bom Jesus de Iguape, e a contribuição cultural de imigrantes que vieram buscar uma nova vida. Italianos, japoneses e tantos outros que escolheram Iguape como lar trouxeram consigo costumes, sabores e formas de vida que até hoje enriquecem o cotidiano da cidade. O bairro de Jipovura, marco da imigração japonesa no Brasil, é um exemplo vivo de como a cidade acolhe e se transforma, como as águas do rio que refletem sempre um novo céu.
Hoje, Iguape é uma cidade de contrastes: um lugar onde o passado se mistura ao presente, onde a simplicidade do cotidiano se encontra com a majestade do patrimônio histórico. Em suas ruas de pedra, nos casarões coloniais, na paz que envolve a paisagem, percebemos um lugar que encontrou harmonia em sua história, que abraçou tanto as glórias quanto as cicatrizes e aprendeu a seguir adiante. Iguape nos ensina que o tempo não é apenas uma força destrutiva, mas também um escultor, que nos molda e transforma.

Assim, ao celebrar os 486 anos de Iguape, somos lembrados da importância de persistir, de honrar nossas raízes e de acreditar na renovação constante. Iguape nos ensina que é possível começar de novo, com a mesma paciência das marés que desenham a enseada e do rio que, em silêncio, segue em direção ao mar. Que os próximos séculos tragam novos sonhos, novas conquistas e, sobretudo, a eterna lição de que a beleza do tempo está na sua capacidade de transformar e de fazer florescer, sempre.
Por: Melquisedeque J Santos